Você sabia que as primeiras sementes de maconha foram trazidas ao Brasil pelos negros raptados?
Isso mesmo! Os africanos trouxeram sementes de cannabis para o Brasil objetivando aliviar os sofrimentos que tão severamente lhe eram impostos.
Então, significa que a criminalização da maconha coincide com o preconceito às raízes africanas?
Para descobrir, confira o texto a seguir!
Quando a maconha chegou ao Brasil?
A cannabis, planta medicinal, não era cultivada pelos nativos americanos que aqui moravam antes da colonização. Naquele tempo, a planta não era nativa do ecossistema brasileiro.
Segundo o estudo “A história da maconha no Brasil”, a maconha chegou ao Brasil em meados de 1.540, ano em que também foram trazidos diversos negros da África para aqui serem escravizados.
Então, pode-se dizer que foi no período entre 1.500 a 1.550 que a erva foi introduzida no país, embora não se tenha certeza da data específica em que a primeira planta foi semeada em nosso solo.
A partir daí, seu uso foi difundido entre a população e perdura até os dias atuais.
Como a maconha chegou ao Brasil?
A introdução da maconha coincide com a chegada dos negros trazidos do continente africano para serem escravizados no Brasil. Era comum o uso da maconha nas culturas africanas.
Essas pessoas traziam, escondidas de seus raptores, as sementes da planta, chamadas makana, diamba, liamba, entre as suas roupas ou em bonecas, bolsas e farrapos.
Antes de tudo, a maconha ajudava os africanos a matarem a saudade de sua terra e de sua liberdade tão injustamente roubada, além de aliviar os castigos físicos e psicológicos impostos de forma impiedosa.
Entretanto, não há certeza sobre tal informação, pois, à época, os portugueses também já haviam tido contato com a maconha em suas expedições à Índia.
O que podemos afirmar é que a coroa portuguesa incentivou a produção do cânhamo em território brasileiro, haja vista que a planta podia ser utilizada para fabricar tecidos utilizados nas velas das embarcações portuguesas.
Primeiros registros de uso recreativo da maconha
Com a vinda da cannabis para o território nacional, o uso recreativo da planta logo se difundiu.
Além de ser utilizada pelos escravos, responsáveis por trazer a maconha para o Brasil, o uso recreativo da planta foi disseminado entre os nativos americanos e entre as classes sociais menos favorecidas.
Pessoas brancas e da alta sociedade não tinham interesse pela maconha.
Nessa época, a preocupação com a maconha advinha dos carrascos dos escravos, que não queriam que eles se distraíssem com outras coisas que não o trabalho.
Portanto, conclui-se que, pelo fato de fumar maconha ser visto como atividade de negros escravizados e pessoas sem classe, seu estigma se manteve até hoje.
Mas, atualmente, fumar maconha tem maior relação com o tráfico de drogas presente nas periferias do que um estigma de pobreza, já que as classes média e alta são ávidas consumidoras de cannabis.
O início da criminalização da maconha no Brasil
A criminalização da maconha no Brasil foi originada pela preocupação dos fazendeiros escravistas que não queriam que os escravos se distraíssem do trabalho que lhes era imposto.
A bem da verdade, o uso da maconha já começava a ser estigmatizado socialmente por ser um hábito comum às pessoas mais pobres.
Dessa forma, a criminalização formal da maconha se deu pela primeira vez no Brasil em 1830, através da “Lei do Pito do Pango”, ainda no Brasil-Império, proibida no código de posturas do Rio de Janeiro a venda e o uso da maconha.
Entretanto, essa criminalização não era obedecida e a maconha era adquirida facilmente nas ruas.
A partir do ano 1930, o uso recreativo no Brasil da cannabis passou a ser duramente reprimido, o que é associado pelos historiadores e sociólogos ao preconceito racial.
Nesse momento, a maconha, por ser utilizada com maior frequência pelos negros e pobres, passou a ser associada à degeneração moral, de forma preconceituosa e encoberta pela hipocrisia.
Qual foi o papel do racismo na criminalização da maconha no Brasil?
O Brasil foi um dos pioneiros na criminalização da maconha, além de também ser um dos últimos países a abolir a escravidão.
Ambos os fatos não são motivo de orgulho e podem ser relacionados, já que o racismo é a principal origem da criminalização da maconha.
O preconceito era disseminado em relação a todos os elementos da cultura africana, e com a maconha não foi diferente. O intuito era tornar as pessoas negras marginalizadas e tirá-las os aspectos de sua cultura, que, por sua vez, eram os únicos responsáveis por lhes trazer felicidade e personalidade.
Vícios elegantes x “Fumo do negro”
O preconceito envolvendo a maconha e as culturas africanas sempre foram baseados na mais profunda hipocrisia, ligados justamente à origem da maconha no Brasil.
Por ser importada pelos africanos escravizados, a maconha era comumente chamada como “Fumo de Negro”, com clara intenção de se referir pejorativamente à erva.
O racismo na criminalização da maconha sempre foi exposto, pois, enquanto julgavam os usuários de maconha, pessoas brancas e ricas recorriam a outras substâncias entorpecentes com efeitos psicotrópicos e colaterais gravíssimos, tais como:
- Ópio: uma substância psicotrópica muito difundida entre os jovens burgueses, que causava dependência química;
- Álcool: o álcool era muito consumido pelos burgueses de forma praticamente diária;
- Tabaco: o consumo do tabaco em cachimbos ou cigarro era visto como forma de demonstrar status.
Enquanto a maconha era hostilizada e, depois, criminalizada através da Lei do Pito Pango, os outros vícios mais difundidos entre os burgueses eram vistos como comuns e até como sinal de status.
Como a maconha aparece na cultura africana?
Erva sagrada
A maconha nas culturas africanas tem um papel de suma importância em diversos aspectos, inclusive nos religiosos. A erva era, naquela época e continua sendo até hoje, sagrada em diversas religiões de matrizes africanas.
Para o Rastafarianismo, um modo de vida de origem africana, a maconha é considerada sagrada e possibilita ao homem se conectar com à Terra e o todo.
Além do Rastafarianismo, outras matrizes africanas também veem a maconha como erva sagrada.
Segundo tal ponto de vista, a maconha possibilita iluminação e mais proximidade para com Deus ou Jah, como é chamado na religião Rastafari.
Além disso, também é vista como uma erva de cura sagrada, pois traz alívio e relaxamento durante a jornada para a liberdade.
Em resumo, o uso da maconha como erva sagrada pôde ser observado ao longo da história como um veículo da iluminação, vista como salvação e restauração para o ser.
Religião e cura
Dentre os principais efeitos da erva, podemos citar o relaxamento do corpo e da mente.
Sob o efeito da maconha, o indivíduo tem tendência a esquecer de suas preocupações, torna-se mais alegre e com pensamentos positivos sobre a vida e sobre o mundo.
Por isso, a maconha sempre foi considerada por muitas das religiões de matrizes africanas como instrumento de cura e iluminação do ser humano. Além disso, é considerada um instrumento que dá ao indivíduo uma visão uniforme com o planeta, os animais, o universo e, principalmente, com Deus.
Candomblé
Uma das religiões de matriz africana mais difundida no Brasil é o candomblé. Ainda hoje existe muito preconceito em relação a essa religião, que sofre constantes ataques e injustiças.
No candomblé, a maconha teve e tem um papel importantíssimo. Muitas vezes, a planta era utilizada para facilitar a incorporação dos médiuns. Atualmente, os adeptos do candomblé não utilizam mais a maconha para suas festividades devido a sua proibição legal.
Embora a planta possua efeitos medicinais e altamente sedativos, a maconha era associada falsamente a rituais violentos e animalescos, como forma de se difundir a discriminação da cultura africana.
Conclusão
Com o intuito de marginalizar a cultura dos povos africanos, foi aberta uma verdadeira caça às bruxas em território nacional para quem comercializasse ou utilizasse a erva de modo religioso / recreativo.
Ainda hoje há muito preconceito em relação à maconha, principalmente ao se debater seu uso recreativo.
Certamente não será fácil desvincular séculos de preconceitos em uma única geração. De qualquer forma, deve ficar claro que utilizar ou não a maconha é um aspecto cultural, e não um problema de saúde pública, haja vista que o álcool é largamente consumido sem haver juízo de valor sob seu uso.